Logo ali, na esquina, havia um banco. Não se trata de um banco, estabelecimento tão
comum hoje em dia, onde se deposita, saca-se dinheiro e se realizam tantas outras
transações financeiras. No tempo deste banco do qual pretendo contar a história, nem se
imaginavam coisas desse tipo lá na Palma. Para o bem da verdade, também não era um banco
praceiro nem de jardim que existem nas cidades; era um banco de calçada, bem na esquina.
Ah, era um banco pobrezinho! Uma prancha de madeira tosca, acredito que de pereiro,
com um pouco mais de um palmo de largura e uns seis pares de bundas de comprimento.
Sustentava-se em duas pernas, em forma de cambito, nas suas extremidades. Não parecia ter
sido feito por marceneiro ferramentado. Porém, a face de sentar-se era lisinha, lisinha; não
porque tenha sido envernizada, acredito que pelo constante roçar das bundas que nele se
sentaram ao longo de anos.
Como ficava na rua onde eu morava, eu passava por ele várias vezes ao dia e,
dependendo da hora, estava vazio ou abundante de frequentadores. Durante a semana, no
início ou no final do dia, estavam lá sentados ou em pé, à sua volta, senhores respeitáveis da
sociedade, muito deles, autoridades constituídas, como prefeitos, ex-prefeitos, vereadores,
coletor, juiz, delegado; não me lembro de ter visto o padre. Aos domingos, antes da missa
das nove, a frequência era mais democrática, fazendeiros e pessoas que moravam na zona
rural entravam na bodega, em cuja calçada ficava o banco, para tomar uma pinga da
cacimbinha ou um trago de conhaque São João da Barra e, no banco sentavam-se à espera da
missa começar.
Pela característica eclética de seus frequentadores e, considerando-se que havia, desde
contritos irmãos Marianos até ateus, que nunca botaram o pé na igreja, simpatizantes dos
partidos azul e encarnado e adversários políticos, reinava, acima de tudo, o signo da
confraria, da amizade e do respeito entre seus frequentadores. Hoje, olhando para trás, diria
que era como um fórum informal, um "Senadinho", onde senhores, acima de todas as
diferenças, confabulavam sobre quase tudo que fosse de seu interesse e da sociedade
palmense. Conversava-se sobre tudo: o pesar pela morte de alguém da cidade; a vaca que
morreu de mordida de cascavel; a enchente do rio; o preço do algodão e da torta de caroço
de algodão (resíduo para ração do gado), quem chegou de Fortaleza pela Macaboqueira, os
melhoramentos na cidade, como o calçamento das ruas, até sobre o tamanho da procissão e
tantos outros assuntos, próprios de cidadezinha de vida pacata e gente amiga.
Tenho vivo na memória visual e emocional os principais protagonistas da história desse
banco. Meu pai, os irmãos Gomes Deusdédit e Dimas, seu Totonho Aguiar, Vilar, os prefeitos Novo Camilo e Vicente Benício, o juiz Dr. Ribeiro, que morava na casa vizinha, os
irmãos João Teles e Chico Teles, seu Doda Machado, Dr. Manoel de França, nas vezes que
vinha do Cunhassú para presidir às reuniões da Câmara Municipal e alguns outros que me
escapam à memória agora. Um dado interessante: não havia mulheres frequentadoras do
banco, não que eu me lembre; se alguém lembrar de alguma que me diga. Aliás, as
mulheres, senhoras ou jovens, costumavam mudar de calçada para não ter que passar na
calçada do banco quando estava lotado. Não era, acredito, com medo de serem mal
faladas, pois, como já disse, eram senhores respeitáveis seus frequentadores; elas
costumavam, também, segurar a saia "pro mode" o vento não levantar.
Para os palmenses já compridos nos anos, já devem estar desconfiados de qual banco
estou falando e os da geração pós-banco, procurem se informar com seus pais ou familiares
que, certamente, confirmarão esta minha história, pois estou falando do Banco do Jaime, um
senhor tranquilo e muito cuidadoso, com o asseio de sua bodega, estava sempre com um
pano na mão limpando as garrafas e o balcão. O banco ficava na calçada de sua bodega na
esquina da rua de Baixo com a rua da Casa Paroquial, bem em frente à antiga loja do Vilar. Foi ali, naquela calçada, naquela banco que não existe mais, cujos frequentadores mais
antigos já passaram pro andar de cima, que a história de Coreaú escreveu alguns de seus
capítulos. Foram aqueles senhores que deixaram uma geração de homens e mulheres de bem
que hoje orgulham a nossa terra. Hoje, fico com as lembranças e, às vezes, a saudade do meu
pai vem junto com saudade de todos aqueles veneráveis senhores a quem aprendi respeitar
e dos quais nunca esqueci.
Se eu fosse Prefeito de Coreaú (sei que é um projeto caro), faria uma escultura em
bronze do Banco do Jaime, com a estátua de Jaime sentada nele, ao molde do que há no Rio
com o poeta Carlos Drummond de Andrade. Afinal, a história de uma sociedade, de uma
cidade se eterniza pelas gerações seguintes, homenageando-se e preservando-se a memória
de seus construtores. Declararia o Banco do Jaime patrimônio histórico e cultural de Coreaú.
Mardone França
Membro-honorário da APL